Ressurgir das cinzas?

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A vitória de domingo pode ter representado um marco nesse novo rumo da caravela da cruz-de-malta, saindo dos sombrios mares no qual navegava e passando a navegar por mares bem mais tranquilos. Mais importante do que os três pontos no cômputo desse campeonato foi a devolução da autoestima e do sentimento de confiança ao torcedor vascaíno, em especial, antes desesperançoso, temeroso e triste pela fase de seu clube refletida no time de futebol a nos representar.

Não quer dizer, no entanto, que todos os problemas estejam resolvidos. Não podemos de forma alguma cair no devaneio de que esse atual time seja para ser campeão ou até mesmo para disputar uma vaga para a próxima Libertadores. Antes de assim pensarmos, devemos nos lembrar bem que, até a véspera do jogo, o sentimento era de dúvida sobre se conseguiríamos, ao menos, ficar no "G16" e evitarmos a queda traumática para a segunda divisão, o que para nós seria extremamente desastroso, tanto do ponto de vista institucional como comercial.

O que voltamos a ter de momento, aparentemente, foi um time com alma e autoestima, o que na minha concepção se trata do primeiro grande passo para que coisas maiores possam vir daqui para frente. Com o mínimo de organização tática em campo e voltando a ter uma referência no time – Juninho Pernambucano, meu ídolo e de muitos torcedores vascaínos e com toda razão conquistou nesse posto – pôde-se notar um hiato do tamanho gigante de nosso clube entre o que, até então, havíamos apresentado nesse campeonato e o que apresentamos no domingo passado.

Ao passo que possa se tratar de uma visão meramente simplista para muitos, não há como não admitirmos que Juninho, nesse momento, é o grande responsável direto por essa devolução da alma e do sentimento de autoestima ao time. Aos que ainda duvidam de seu sentimento pelo "ser Vasco", vale a lembrança de que, como bem nosso craque da camisa oito disse, teria sido muito pior ele voltar para jogar em outro clube do que ter voltado mesmo com as declarações outrora dadas ao final do ano passado e que não se tratavam de mentira alguma. Mesmo com sua idade, Juninho é diferenciado em tudo: desde sua técnica à sua postura. Seus companheiros assim compreendem e a torcida, com ele em campo, se permite a sonhos bem mais altos.

Se não fizemos um jogo sensacional (e até acho que, sob o olhar técnico, ainda temos muito o que acertar), ao menos jogamos em igualdade de condições contra um adversário mais qualificado tecnicamente, mais maduro e com o time mais pronto. E essa notável melhora, mesmo que seja cedo demais para lhe atribuirmos "os louros", se deve à postura e ao trabalho de uma semana árduo de Dorival Júnior, que se preocupou nesse pouquíssimo tempo em fazer àquilo unicamente que o ex-treinador não fez em quase quatro meses: treinar o time com afinco. Em que pese o fator numérico ao nosso favor durante a maior parte do jogo, soubemos aproveitar um momento de extrema ingenuidade do ídolo tricolor para que pudéssemos trilhar o caminho da vitória de forma mais tranquila, sabendo aproveitar tal vantagem numérica em campo também.

A grande preocupação nesse momento para mim, no entanto, é não deixar a euforia encobrir as deficiências que ainda possuímos e nem deixar o sentimento conformista tomar conta de nosso espírito torcedor. É bem verdade que o horizonte no qual vislumbramos agora é muito melhor do que há vinte dias atrás, mas o Vasco vive da pressão de sua torcida que, carente de grandes conquistas da magnitude de um campeonato brasileiro faz tempo, cobra e com razão para que a evolução não pare e para que, passada a tempestade de desordem administrativa ao extremo e de crise financeira em caráter asfixiador, possamos retomar o caminho do progresso em tempo de voltarmos à disputa pelos primeiros postos desse certame, o que para Vasco não é mais do que a sua obrigação como Gigante que é.

Ajustes necessários

Com a chegada de Fágner e de Guiñazu – duas posições providenciais no qual estávamos muito carentes – o Vasco se permite a nem mais pensar no risco de rebaixamento. No quadro anterior vivenciado, era questão de tempo para que ele viesse. Atualmente, não mais. Considerando que não serão todos os jogos que Juninho irá jogar, precisaríamos de mais um meio de campo armador para substituí-lo, sempre que necessário for.

Além disso, a chegada de mais um zagueiro e de um lateral-esquerdo poderia (ou poderá, quem sabe) trazer maior consistência ao setor defensivo. E, ao meu ver, o principal setor de grande parte dos times campeões que o Vasco teve ao longo de sua história. No bincampeonato carioca 1992-1993, por exemplo, o Vasco tinha Jorge Luís e Torres como dupla de zagueiros; ao passo que, no ano seguinte, o tricampeonato veio com Ricardo Rocha e Torres como responsáveis pela defesa. Em 1997 em diante, tivemos uma época dourada em conquistas com, na maioria delas, Mauro Galvão a comandar a defesa, ao lado do correto Odvan. Recentemente, rompemos o "jejum" de conquistas com Dedé e Ânderson Martins a nos resguardar.

Na atualidade e considerando Rafael Vaz (mesmo que muito cedo), como uma grata surpresa, um zagueiro mais técnico e experiente ao seu lado e um lateral-esquerdo mais qualificado nos daria uma linha defensiva completa de confiança. Considerando ainda Diogo Silva um goleiro correto e o melhor que possuímos hoje mas crendo que a cheqada de outro mais experiente pudesse dar uma segurança maior a todos, estaríamos (ou estaremos, o futuro é quem vai dizer) mais completos, tornando-os reais candidatos às primeiras colocações.

A dúvida que paira para nós é somente em torno do que a direção do Vasco deseja a partir de agora: fazer a diferença, olhar para frente, recuperar o tempo perdido e partir para montar um time que, realmente, traduza o sentimento de "querer vencer" do torcedor; ou se conformar somente com a fuga do descenso tendo como referencial o caos no qual a própria direção foi a responsável direta. Qual caminho seguiremos, a partir de agora, tendo melhores condições (mesmo que, ainda, muito ruins devido à grande dívida que o Vasco possui), com novos patrocinadores, com o retorno das certidões e a volta às tratativas com o empresário que, antes, fazia negócios com o clube, deixou de fazer durante um ano e voltou a fazer agora? O que o Vasco deseja, a partir de então?

O fator empresário

Sobre esse último levantamento feito por mim, não sei ao certo qual postura o Vasco adota, a partir de então, com relação ao tratamento com o empresário que volta a colocar jogadores no Vasco. No antigo modelo, ficamos "reféns" de um profissional que, após negociar seus atletas no ano passado, deixou o clube sem um time capaz de manter a competitividade que possuía. Por culpa do próprio Vasco, ausente de boa gestão, que se calcou no modelo monopolista e que na sua ausência como parceiro não soube a quem recorrer e nem como recorrer para que pudesse salvar seu ano futebolístico.

Nesse momento de reaproximação, não sabemos ao certo (eu, particularmente, pelo menos) se o clube aprendeu a lição ou se, tal como em 2011, irá recorrer ao mesmo para formação de um time competitivo para que, depois em caso de nova "debandada", o clube se mostre "refém" mais uma vez e fique "à deriva" e com o mesmo final presenciado após julho de 2012. Ou se durante esse tempo haverá o amadurecimento necessário para que haja um plano de contingência em caso de revés nesse relacionamento, se assim ocorrer dentro de um futuro próximo.

Particularmente, sempre fui contra qualquer modelo que atribua o monopólio de uma situação a quem quer que seja. Ao invés de se confiar plenamente em um empresário e dele se aceitar a qualquer um que lhe é indicado, o Vasco deveria, como em um clube mais bem estruturado ocorre, trabalhar com mais de um empresário e se fazer valer da concorrência entre eles em benefício próprio do "material humano" que poderia ter como retorno em virtude dessa disputa sadia.

Qual será, então, o modelo que veremos no Vasco, após a "tempestade" que devastou a nau e que serve como referência do que não se deve seguir?

"É o destino"?

Confesso-lhes que foi a coisa mais ridícula a frase colocada no mosaico da torcida tricolor nesse último domingo. Entretanto e pensando melhor depois do jogo, percebi que eles tiveram toda a razão: tal como no provérbio "e ao pó voltarás", no momento em que o futebol volta a ser privilégio da elite coube ao clube que quebrou esse paradigma a lhes dar uma lição, com direito a "golpes" certeiros de dois jogadores negros rejeitados pelos próprios quando no início do esporte bretão em seu clube e de nosso ídolo a lhes provar que "tradição não se compra; se conquista".

E sobre a polêmica troca de lados de nossa torcida: ainda que, para mim ao meu ver, tenha sido uma derrota institucional (por culpa do próprio Vasco, que se deixe bem claro, e sobre isso escreverei nos meus próximos textos), por outro já faz parte de nossa cultura, enquanto não tivermos a devida reação fora de campo, devolvermos em campo todos os golpes recebidos por nós nos bastidores. Na esperança de que um dia o Vasco volte a enxergar esse mesmo clube como adversário, e não como "parceiro" que jamais foi e que demonstra novamente sua real índole.

Apenas uma pergunta bem cabível ao nosso Presidente que, no entanto, se doeu pelo acontecido: será que ele foi, realmente, inocente ao ponto de não saber que assim seria quando o adversário tivesse sua chance de nos golpear?

Vencedor do último desafio

Parabenizo ao estimado leitor ALEX XAVIER por sua quarta vitória no desafio semanal proposto em presente coluna semanal! Em tempo: a estreia do goleiro Hélton em jogos oficiais como titular do gol vascaíno no Campeonato Mundial da FIFA em 2000 foi no jogo Vasco 2 vs 0 South Melbourne, da Austrália, com gols de Felipe e de Edmundo.

Desafio da semana

Na campanha dos títulos brasileiros de 1997 e de 2000, o Vasco venceu o Fluminense, respectivamente, pelos placares de 3 vs 1 e de 4 vs 3, ambos os jogos disputados no Maracanã. Sobre esse último confronto citado, em 2000, quais foram os autores dos gols da vitória cruz-maltina?

"Toque final"

E segue o "bolão" da vez…qual será o primeiro treinador "filósofo" a cair em seu clube: René Simões ou Paulo Autuori? E para esse último: haverá "força mental" suficiente para suportar tanta rejeição por parte da torcida do clube em que ele dirige, nesse momento?

Cristiano Mariotti

cris.mariotti@crvasco.com.br

Twitter: @crismariottirj

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