Só a profissionalização salva?

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Muito tem se comentado nesses últimos tempos a respeito da profissionalização como única forma de salvar aos clubes de futebol do caos administrativo e financeiro no qual alguns deles (o Vasco, infelizmente, como exemplo) se meteram nas últimas décadas. De fato, é estarrecedor como uma instituição capaz de produzir mídia no esporte mais popular do planeta e girar capital em proporções milionárias (alguns desses clubes brasileiros, com capacidade para atingir bilhões de reais dentro de alguns anos) possa ser administrada com mentalidade amadora, como um hobby ou por pura dedicação somente por pessoas já com sua vida profissional encaminhada e que possa se dedicar ao clube de seu coração. 


Não que se duvide do caráter dessas mesmas: apenas é questão de bom senso não ter que parar com sua vida profissional ou tirar parte dessa mesma vida de seu cotidiano pelo clube que ama. Mesmo porque, tal como já disse certa vez o ex-Presidente Agathyrno Gomes em 1985, ser um grande empresário, dono de um grande comércio ou supermercado não garante seu bom desempenho como Presidente de um clube. Tendo, ainda, como fator agravante a paixão do torcedor por uma marca, o que não se encontra em produtos do gênero alimentício, por exemplo. Afinal, se um produto não lhe satisfaz, consome-se outro. No caso do desporto, a pessoa é consumidora eterna daquela marca e, portanto, sente-se triste, traído, com raiva entre outros sentimentos quando vê a marca de sua paixão mal tratada ou entregue ao descaso.


O grande “fiel dessa balança” entre paixão clubística e profissionalismo, no entanto, chama-se competência. Uma vez perguntado para mim o que eu pensava a respeito da profissionalização dos clubes de futebol, coloquei-me totalmente favorável desde que seguisse a dois princípios: que o Presidente do clube e demais cargos (1º e 2º VPs) fossem sócios do clube, portanto, conhecedores de suas raízes, de sua história, missão e visão como entidade mais do que centenária (no caso do Vasco) e que, acima de tudo, os profissionais que viessem compor à alta cúpula nos mais diversos setores primordiais (jurídico, marketing, finanças, planejamento estratégico e operacional) fossem de competência reconhecida. Pois é preciso, antes de continuarmos a falar incessantemente sobre profissionalismo, ter a consciência de que existem bons e maus profissionais, com experiência e tato para trabalhar em um clube gerador de grandes receitas e outros sem as devidas virtudes. Nesse norteamento, fica de forma clara a ideia de que chega a ser um “mito” pensar que somente a profissionalização resolve, mesmo que ela não esteja ancorada nesses atributos imprescindíveis.


Como exemplo, citem-se os baianos Bahia e Vitória. Declarados como “clubes profissionais” em 2005, no mesmo ano foram ambos “de mãos dadas” rebaixados à Terceira Divisão do certame brasileiro. Dentre os clubes europeus, grande parte deles senão em sua totalidade dos que figuram nas principais competições são declarados como “clubes empresas”. No entanto, poucos prosperam e outros tantos, mal geridos e sem expressividade, “quebram”, como é o típico caso do Parma, equipe que figurou dentre as maiores italianas durante boa parte da década de 1990. Mais recentemente e mais próximo ao Brasil, vemos como exemplo a Universidad de Chile, que após se declarar como “clube profissional” parou de figurar entre os destaques do continente e de seu próprio país. 


Não que os exemplos expostos sejam a antítese da profissionalização. Contudo, remete-nos à reflexão sob dois horizontes: não é a “profissionalização por profissionalização” que irá garantir retorno, muito menos em curto prazo para algumas instituições. Como o exemplo da LaU, que pode ainda obter sua retomada de competitividade dentro de algum tempo e mantendo seu discurso, contudo, fortificando sua gestão e provendo-a de maior capacidade e competência caso seja esse o problema atual. Há de se nascer, ainda, uma mentalidade no sentido de focar esforços e canalizá-los para se chegar ao, até então, equilíbrio distante entre a paixão por um clube e a necessidade de profissionalizá-lo com sabedoria e competência para perpetuá-lo e à sua torcida. O segundo horizonte é o pensamento no retorno desportivo como foco para a gestão. O grande problema, no entanto, é a forma dura e fria como um empresário (mesmo que bem sucedido em sua vida) trata essa questão: gerar lucros financeiros no clube mesmo que não haja conquistas é o caminho mais acertado? Evidentemente que para o torcedor, não. Como o caso do Arsenal da Inglaterra, portador de uma enorme quantia mantida sob poupança, mas sem grandes conquistas faz tempo. No entanto, para que se haja retorno desportivo deve-se haver dinheiro para investimento, e em muitos clubes esse é “um bem escasso”. Como lidar, então, com essa questão, sabendo-se que existem uma marca e uma torcida que precisam ser renovadas com conquistas?


O horizonte vascaíno e a filosofia profissional

Reconhecidamente, o Vasco é um clube tradicionalista e que resiste a profundas mudanças, mesmo que necessárias. Falando de forma bem realista, não será com medidas de impacto que o clube retomará seu crescimento. Tampouco com promessas fantasiosas e sob discursos que destoam da realidade vivenciada nesse momento de nossa história.


O Vasco é detentor de uma dívida. Possui como patrimônio seu estádio e sua torcida, além de uma belíssima história e muitos títulos conquistados, apesar de todas as dificuldades ao longo do tempo. Suas condições momentâneas são um fruto de anos de desordem administrativa e irresponsabilidade financeira. Sabe que existem fatores extracampo que o impedem de obter maior repercussão de seus valores, ao contrário do que lhe acontece no caso de noticiários negativos, esses sim, amplamente repercutidos.


Nesse sentido, volto à linha de raciocínio de que é preciso bem mais do que somente se declarar profissional. É preciso competência e boa vontade para se deixar fazer. Se por um lado eu prezo pela gestão administrativa ser enraizada nos valores adquiridos da “marca Vasco”, por outro admito que o modelo descentralizado, cobrando dedicação e entrega de profissionais capacitados seja o caminho a ser percorrido. No entanto, requer tempo e perseverança, e não será garantia alguma se não houver o devido enquadramento da capacidade de gestão daquela pessoa em sua área de formação à gestão esportiva, que lida dentre outros fatores com a paixão popular.


Na verdade, deve haver um marco definitivo na história do Vasco. Um contrabalanceamento entre ser profissional competente e ser vascaíno. Equilibrar a razão com a emoção e fazer disso uma nova filosofia no clube. Relegar todo e qualquer pensamento amador e, ao sócio do Vasco, cobrar isso de seus diretores. Não somente colocar nos devidos cargos pessoas capacitadas de excelência reconhecida, mas fazer disso uma nova metodologia, capaz de promover compartilhamento desse “know how” em uma visão “top down” de, com o tempo, o próprio clube ser capaz de criar seus profissionais, tal como já criou craques no campo em sua história, incentivando a quem quiser trabalhar um dia, de forma remunerada, para o clube e que goste de gestão a se capacitar para ser obrigado a auxiliá-lo em sua gestão. 


Um trabalho reconhecidamente árduo que deveria (ou deverá, quem sabe) estar previsto em novo estatuto obrigando à cúpula administrativa a cumprir e tendo ao quadro social uma atuação vigilante. Trabalho esse que levaria décadas para dar resultado, mas que o ganho institucional poderia ser enorme e deixando como herança para gerações futuras de vascaínos.


Vencedor da última semana


PARABENIZO, MAIS UMA VEZ (TRI-VENCEDOR!), ao leitor ALEX XAVIER por ter sido o primeiro a responder de forma correta à pergunta do desafio da última semana! Em tempo: quem desperdiçou o pênalti naquela final diante do Fluminense, em 1993, foi BISMARK. Pênalti esse que, graças a DEUS, não foi necessário ao final dos noventa minutos para garantirmos, até então, nosso último bicampeonato estadual de nossa história.


Desafio da semana


Em se tratando de seleção brasileira, lembro-me bem que, em 2000 após a demissão de Vanderlei Luxemburgo na época em que o Vasco possuía um time excepcional, foi convocada uma base do time vascaíno para compor a seleção brasileira que, sob o comando de Candinho, enfrentou e venceu uma equipe sulamericana pelas eliminatórias da Copa do Mundo de 2002. Contra quem foi esse jogo e quanto foi o placar dessa partida?


“Toques finais”


1º) Gostaria de registrar, aqui, meus parabéns aos idealizadores da campanha “Vasco Dívida Zero”, que já chega de forma transparente à marca de quatrocentos mil reais arrecadados em DARFs, auxiliando ao pagamento de dívidas do clube! Sinceramente, a MELHOR campanha já feita de crowfunding em favor de um clube de futebol, no qual temos ciência!


2°) Da série “Perguntar não ofende”: quanto tempo irá durar Renê Simões, “com saudades do comando à beira do gramado”, no Atlético-GO? E seus contratados, tais como André Ribeiro por exemplo: por que ele não os indica para seu novo clube?




Cristiano Mariotti

Twitter: @crismariottirj

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